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Olhos cerrados, logo engolidos.
Entre curiosos, chorosos, os que refletiam o imenso peso entre a vida e a morte, os que bajulavam e os que mentiam, estava alguém que sentia, eu. Naquele tedioso momento que refletia mais que espelho, o que eu havia sido em vida.
Eu havia planejado anos atrás, local, petiscos, a lista de convidados, assinei contratos e se pudesse deixaria até um roteiro, mas por favor, também definiria o traje, seria de contorcer meus ossos estáticos se eu trombasse um desalinhado ali sem se situar que aquele era meu show. Era um lugar seguro pra estar. Meu corpo era adorno, o que fervia ali era a grande pergunta, "por que?" E os cliches claro, tão nova, tão bonita, tão inteligente, tinha o futuro todo pela frente. Do outro lado mas não muito distante, algum esfomeado pensava em levar um pedaço de bolo de canela pra comer mais tarde, um casal questionava se deveriam manter a postura ou brigar ali mesmo, enquanto suas duas crianças com neurodivergencia não diagnosticada passavam em baixo do balcão com tolhas de cetin, estavam amassadas, não tiveram o cuidado ao sobrepor, era um detalhe que me incomodava. Contei que o dia estivesse com ar de mistério, estivesse frio o suficiente, ja que enterrar alguém é ruim mas fazer isso com a nuca colando de suor é uma tortura, roguei pra que os ceus contribuíssem com uma chuva rapida e nao tempestiva, eu agradeceria. Seria umama pequena distração pra os mais entregues, e certamente os pingos escorrendo sob a madeira polida do caixão dariam um charme a mais pra aquela tarde que brevemente seria esquecida. Aqueles que diziam me amar, se atormentariam nos primeiros dias com detalhes que a mente faz questão de esquecer mas raramente consegue. – Era sórdido pra mim pensar no meu rosto tão pálido, azulado, com o tom de base acinzentado que nada combinava, não representava minhas bochechas sempre firmes e coradas – Era estranho pra eles me ver sem vida e aquela injusta imagem seria a última sobre mim em suas cabeças. Os que não amavam mas estavam la me enchiam o peito de curiosidade, eu era mesmo uma diva incompreendida. Por fim, Sem discursos, é meu ultimo pedido. Sem velas, sem exageros, que seja um dia comum e haja ordem e silêncio por que eu realmente odiava barulho em vida, mas já que vocês não vão conseguir calar a porra das bocas, então murmurem, fofoquem, questionem, miseráveis! Foi bom estar com vocês. Apenas sugiro que pensem algo como, se eu quase tudo soubesse, visse, e sentisse... Eu sentia pra caralho. Fiquem com a sensação de "Ela sabia muito de si mesma e ela via o mundo com lanternas nos olhos, flutuava por ai com os pés no chão e a cabeça nas nuvens, ela nunca pertenceu aqui, então ela ficará bem". Fiquem bem, brindem e esqueçam rápido, será um alívio cômico pra essa alma cansada. Atenciosamente, Lume Lavoie.
Lume Lavoie
Enviado por Lume Lavoie em 01/03/2025
Alterado em 01/03/2025 Comentários
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